ARTIGOS


Reencantando as Quadras: Basquete e Espiritualidade
Hugo Lovisolo
e Yara Lacerda

Introdução

O basquete americano tornou-se nos últimos anos um campo de negócios altamente
competitivo. Empresas e empresários, profissionais e clientes; investimentos e lucros, audiência e
publicidade; conflito e competição, materialismo e instrumentalização, mídia e consumo são
palavras que facilmente associamos ao mundo do basquete. Nada, portanto, pareceria estar, em
princípio, mais distante do basquete que a procura de atitudes desinteressadas, a eleição do bem
comum, a solidariedade e a compaixão, enfim, a busca da espiritualidade ou a produção de um
modo religioso de agir nas quadras. Essas atitudes, em princípio, pareceriam estar em oposição
direta ao conjunto de valores que domina a economia do mundo competitivo do basquetebol
profissional.

Contudo, uma das hipóteses, a mais polêmica e bem-sucedida, sobre as relações entre
economia e religião, a de Max Weber, ensinou-nos a pensar nos marcos de uma afinidade eletiva
entre ética protestante e espírito do capitalismo, entre crença religiosa e racionalidade econômica.
Antecedente tão poderoso abre janelas para que possamos enfrentar, com alguma confiança, a
possibilidade de que novas crenças religiosas estabeleçam afinidades eletivas com campos de
atividades considerados, a priori, distantes delas.
Entendemos que a “afinidade eletiva” é uma relação constitutiva, que vai além da confiança
de técnicos, atletas e torcedores em amuletos, fórmulas religiosas, orações ou ritos antes e durante
os encontros competitivos. Assim, descartamos as práticas referidas, destinadas a solicitar ajuda,
apoio ou proteção a forças sagradas ou superiores, um campo de ações sociais superficiais e
pouco interessantes sob o ponto de vista das afinidades eletivas. O que pretendemos considerar é
o fenômeno de imbricação entre espiritualidade ou religiosidade e a dinâmica racional de um
esporte como o basquete. Se pudermos entender essa imbricação, derivaremos experiências
analíticas que talvez nos possibilitem entender outras imbricações em curso. Afirmaremos que
existe imbricação quando valores religiosos ou espirituais estão solidamente vinculados a
recomendações técnicas ou fatuais, quando valores e fatos formam um entretecido consistente.
As culturas atuais aparecem marcadas por duas atitudes polares no campo religioso. De um
lado, pela presença do integrismo, que se caracteriza pela rejeição de uma modernidade na qual a
religião seja uma questão de opção. De outro, por uma tendência moderna que aposta no
pluralismo e abre espaço para que os indivíduos desenvolvam composições religiosas à vontade,
fórmulas ou formas pessoais de espiritualidade e religiosidade em clara correspondência com
valores individualistas e relativistas e com fortes possibilidades de construção e desconstrução
(Champion, 1995). Essas características parecem confrontar-se e extrair forças de um ativo
fermento religioso que toma forma e força, sobretudo, a partir dos anos 70. Fala-se suficientemente
em um despertar e em novas formas de consciência religiosa, e os fenômenos vinculados à New
Age circulam fluentemente na literatura especializada e jornalística.
Características significativas do religioso no Ocidente, como o lugar central do pecado e
de sua liberação, entraram em poderoso declínio pari passu ao aumento da heterogeneidade
religiosa, cujo efeito mais visível é a multiplicação das seitas, das religiões e das fórmulas pessoais.
Como resultado geral fala-se na perda ou declínio da institucionalização da vida religiosa. O
sincretismo e, ainda mais, o ecletismo religioso tornam-se cada vez mais freqüentes e legítimos, e
antigas e novas postulações são reconhecidas como religiões. Michel de Certeau tinha anunciado,
em Le christianisme éclaté, a crescente desinstitucionalização do cristianismo, que cedia lugar a
um crescimento dos cristãos sem Igrejas. A leitura da Bíblia deixaria de estar submetida à
comunidade de crentes e multiplicar-se-iam suas interpretações, ganhando legitimidade as
realizadas como meramente individuais e que podem estar influenciadas ou em interação com
leituras de outras tradições. O cristianismo torna-se flutuante, e assistimos ao florescer das
“religiões paralelas” no contexto ocidental: diversos esoterismos (que perdem sua significação de
ocultos para receber a de religiões não oficiais), crenças e práticas para-religiosas, antigas e novas,
como a vidência e a meditação.
Um elemento importante do panorama é que os que aderem a essas práticas estão
orientados para a autoperfeição, para a autenticidade, para o pertencimento que se realiza
preferentemente mediante um trabalho sobre a própria interioridade, e também para o
pertencimento a comunidades emocionais, ao invés de, como em versões tradicionais, para o
estudo e a aquisição de ensinamentos.1 Tais características apontam claramente para a presença de
valores românticos, salientados entre outros por Berlin e recentemente retomados por Taylor.2 As
novas religiosidades místico-esotéricas também se relacionam significativamente com objetivos mais
práticos, como a procura da saúde e do equilíbrio pessoal ou do agir confluente das dimensões ou
partes do eu. Temos a impressão de que os investimentos no desenvolvimento de um espírito
pessoal equilibrado, saudável e integrado, parecem tecer objetivos terrenos mais significativos que
a elevação ou ascensão a uma dimensão sagrada, presente ou futura.
A heterogeneidade e a diversidade do processo religioso tanto podem nos levar a pensar
no declínio e, no extremo, na diluição do sagrado, quanto na emergência de novas formas,
marcadas pela importância da definição e expansão individual, sob o ponto de vista dos adeptos.
1 Uma panorâmica sobre as “comunidades emocionais” no campo religioso é trabalhada por Hervieu-Leger
(1997).
2 No caso de Berlin, ver especialmente seus trabalhos sobre Vico e Herder. Ver Lovisolo (1992) para uma
ampliação das concepções sobre romantismo e iluminismo e as forças que trabalham na direção de sua
conciliação inconciliável sob o ponto de vista formal ou filosófico. O comunitarismo de Taylor encontra
fundamentos na posição herderiana sobre a linguagem e suas implicações. Ver Taylor (1997).
Assim, as fórmulas pessoais tanto podem ser entendidas como emergência de nova espiritualidade
ou religiosidade, fim da secularização, quanto como mera utilização instrumental cujo destino final
seria a diluição do sagrado. Há, portanto, dois caminhos lógicos: a) o sagrado desaparece porque
apenas passa a existir o profano, ou b) incorpora-se uma visão anterior de encantamento do mundo
pelo qual tudo se torna sagrado, imanente e holístico. O segundo caminho, como veremos adiante,
parece ser o escolhido por Phil Jackson.
Podemos pensar, de modo heurístico e também em nome da esperança, em outros
momentos de efervescência espiritual nos quais também vozes bem fundadas profetizavam o
declínio da religiosidade. Vauchez (1995), a partir das observações de Genicot, trabalha a hipótese
de possibilidades crescentes de desenvolvimento espiritual quando as coerções econômicas
afrouxam. Épocas medíocres, sob ponto de vista econômico, também podem sê-lo sob o ponto de
vista religioso. O renascimento econômico e intelectual dos séculos X e XI foi, segundo Vauchez,
acompanhado “por uma renovação do interesse pela interioridade. (…) quando se alargou a
estreita faixa daqueles que, na sociedade ocidental, tinham acesso à vida do espírito, houve
progresso no plano cultural, e uma elevação no nível das aspirações religiosas” (1995: 181).
Deslocando a observação de Genicot-Vauchez, poderíamos aventurar a hipótese sobre o papel do
êxito profissional, nas sociedades ditas “afluentes”, como condicionante da expansão e
aprofundamento das preocupações com a espiritualidade, que já teriam estado presentes no
movimento estudantil e da contracultura dos anos 60, com seus efeitos significativos sobre as
classes médias e, em particular, sobre grupos com capital cultural elevado. Em outros termos,
poderíamos orientar-nos pela hipótese de que a satisfação de ambições materiais e profissionais
pode “liberar” ou “impulsionar” os indivíduos para preocupações bem mais espirituais. O perigo a
ser superado na ação premiada com o sucesso é, paradoxalmente, segundo Michael Jordan, que
ele “faz o nós voltar a ser eu”. O mal, que torna o nós eu, poderia, num mesmo movimento, ser o
sinal da resistência para construirmos o Nós e o sinal ou a abertura para o sentimento do vazio, da
falta de sentido, que parece estar ocupado quando a luta por objetivos materiais ainda domina o
plano das emoções.
Vauchez situa “a espiritualidade como um conceito moderno, utilizado somente a partir do
século XIX. Para a maioria dos autores, ele exprime a dimensão religiosa da vida interior e implica
uma ciência da ascese, que conduz, pela mística, à instauração de relações pessoais com Deus”
(1995: 7).3 A tendência dominante, segundo Bloom, nas tradições religiosas ocidentais é
institucional, histórica e dogmática, sendo Deus encarado como externo ao eu. Contudo, sempre
houve o caminho do conhecimento interior, condenado pelas fés institucionais. “Já por no mínimo
dois séculos, a maioria dos americanos vem buscando o Deus interior, em vez do Deus do
cristianismo europeu” (Bloom, 1996: 19). O Deus interior pode significar, para os atores sociais, a
procura da ascensão a um estado pessoal definido por valores tais como equilíbrio, eliminação do
egoísmo, autocontrole da angústia e da ansiedade, compaixão, impecabilidade, fraternidade e
solidariedade entre outros. Nessa procura, a construção de fórmulas de crenças pessoais e de
práticas é habitual. Retomaremos este tópico adiante.
O núcleo paradoxal: basquete e espiritualidade
Colocaríamos quase que naturalmente palavras como compaixão, não egoísmo e busca
espiritual como valores que devem ser procurados fora do campo do basquete profissional.
Aceitaríamos, talvez com maior facilidade, que esses valores fossem associados com as atividades
do velejador, do alpinista, do surfista ou do praticante de vôo livre, enfim, com atividades não
diretamente competitivas e que, dominantemente, apelam para valores de integração com a
natureza procurando absorver sua espiritualidade. Campos esportivos menos penetrados pela
3 É interessante consignar que Gilberto Freyre considerava 3a mística espanhola, e por extensão ibérica, central
para nossa cultura e em nada inferior a outros desenvolvimentos místicos. A tradição da mística ibérica não
parece haver sido suficientemente trabalhada nos estudos sobre religião em nosso contexto.
lógica dos negócios e do espetáculo, e onde o não egoísmo, a compaixão e a busca espiritual
aparentemente possuem um nicho ecológico mais propício. Campos esportivos que lidam com
espaços ainda naturais, cuja padronização é muito baixa e onde o acaso da interação com a
natureza se faz significativamente presente. Em contraposição, o basquete lida com um espaço
padronizado, produzido artificialmente e livre dos acasos da natureza, seguindo a tendência
moderna para a maioria dos esportes.4
Phil Jackson, contudo, não exercitou essas atividades esportivas menos padronizadas e em
contato com a natureza. Sua vida, como jogador amador e profissional, assistente e técnico, apesar
de uma curta passagem pelo beisebol, esteve vinculada ao esporte talvez mais empresarial e
competitivo existente, o basquete. O livro de memórias sobre sua vida, Cestas sagradas — lições
espirituais de um guerreiro das quadras (1997),5 inicia-se dizendo:
Este livro é sobre uma visão e um sonho. Quando fui nomeado técnico dos
Chicago Bulls em 1989, meu sonho não era apenas vencer campeonatos, mas fazer
isto de uma forma que unisse as minhas duas grandes paixões: o basquete e a busca
espiritual. A princípio isto pode parecer uma idéia absurda, mas eu sentia
intuitivamente que existe um elo entre o espírito e o esporte. (p. 17)
Podemos então formular algumas questões significativas: como é possível que Phil Jackson
tenha conseguido ser um técnico espiritualista e de êxito num meio dominado pela lógica
instrumental? Como é possível que encontrasse espaço para tentar colocar em prática uma idéia
4 Sobre a domesticação do espaço esportivo conferir as análises de Parlebás (1988). O basquete foi criado para
espaços fechados, para quadras artificialmente projetadas. A domesticação do espaço e a padronização das
regras do esporte não impedem, contudo, que a cultura o subcultura penetre nos “estilos” dos jogos. Conferir
para o basquete, como exemplo, a análise de George (1992) sobre o impacto da cultura negra americana no estilo
do jogo.
5 A tradução brasileira é de 1997, mas o original em inglês, Sacred hoops, foi publicado em 1995.
absurda pela tremenda tensão entre os valores contrapostos que procura fundir? Estamos diante de
atitudes espirituais valorizadas ou pelo menos aceitas num território que definiríamos como pouco
fértil para as mesmas? Temos, então, um paradoxo: valores, atitudes e condutas espiritualistas num
meio concebido como materialista, tecnicista, instrumentalista, consumista e competitivo. Se algum
tipo de espiritualismo pode vigorar nessas circunstâncias paradoxais, temos que formular um
horizonte de perguntas mais abrangentes para formular respostas que nos ajudem em sua
compreensão. Assim, por exemplo, estaríamos diante de mero acaso ou de possibilidades sempre
renovadas pela ação de forças culturais densas e de longa atuação em nossas sociedades? Talvez
renovadas pela própria experimentação com os estilos de vida materialista e consumista? Ou será
que a imagem dominante que temos de nossas sociedades como consumistas e materialistas, enfim,
afluentes, não é apenas uma parte da verdade e, ainda em atividades rotuladas com essas
expressões, os valores espirituais teimam em retornar ou, mesmo, jamais saíram delas? Será que a
busca espiritual continua sendo uma força significativa e a interação de tradições complexas e
contrapostas pode determinar a coexistência do consumismo espiritual e do espiritualismo
consumista e não somente das alternativas consumista ou espiritualista? Tais perguntas gerais
funcionam como um horizonte envolvente ou estão por baixo dos comentários que realizaremos
sobre a autobiografia de Jackson e apenas serão retomadas, explicitamente, na parte final do texto.
A constelação familiar
Jackson nos informa que o clima da vida familiar foi um sólido chão para sua formação
espiritual. Apresenta-nos sua mãe como uma pessoa passional em sua relação com a religiosidade
e que, desde adolescente, tinha uma profunda vocação evangelizadora. A Bíblia era para ela um
livro profético, e ela acreditava que o “tempo” estava chegando. O pai foi uma pessoa compassiva
e calorosa, com uma visão da vida baseada na tradução literal das Escrituras. Enfim, um homem de
Deus puro e simples. Vinculados pela fé e pela atividade religiosa, a vida familiar seguia o ritmo da
vida da Igreja. Jackson cresceu num clima de fé e de atividade religiosa cotidiana, e as esperanças
de no futuro tornar-se pastor estiveram presentes durante anos em seus projetos de vida. Contudo,
na adolescência, quando sua fé deveria ser confirmada por sinais, basicamente experimentando
fisicamente a presença do Espírito Santo no “falar em línguas” — uma espécie de transe cuja
vivência indica a manifestação do Espírito Santo —, os sinais não se fizeram presentes. Segundo
ele, “aquilo nunca iria acontecer em mim.6 Comecei então a sair cedo do culto. Minha mãe não
ocultou o desapontamento” (p. 41). Jackson abre sua mente ao ceticismo.
Possuidor de características físicas apropriadas, altura e comprimento dos braços, o
basquete tornou-se atividade “salvadora” que concentrava energias e canalizava impulsos juvenis,
especialmente os que se derivavam das competições ou conflitos entre os irmãos, segundo o
próprio Jackson (p. 42). Um campo de atividades substitutivas para o projeto religioso.7
Aparentemente, uma sublimação pelo esporte da vontade ou dos impulsos religiosos, segundo ele
mesmo. Vencer tornar-se-ia para Jackson uma questão de vida ou morte (p. 42).
Jackson, de fato, teria podido mediante o mundo competitivo do basquete distanciar-se
poderosamente dos valores familiares e sobretudo da busca do espiritual, dado que as
confirmações de religiosidade ou de espiritualidade do credo familiar não lhe aconteceram como
manda a tradição. Também poderia continuar sua procura espiritual recorrendo a outras tradições,
6 Paulo, na Primeira Carta aos Corintos, 14, destaca a superioridade dos dons da profecia sobre o “falar em
línguas”. Aquele que “fala em línguas” não fala para os homens, e sim para Deus. Ninguém o entende, pois fala
coisas misteriosas sob a ação do Espírito. Aquele, porém, que profetiza, fala para os homens, para edificá-los,
exortá-los e consolá-los. Aquele que “fala em línguas edifica-se a si mesmo; mas quem profetiza, edifica a
comunidade”. Jackson podia contar com Paulo como aliado em seu caminho para predicar sua religião pessoal.
Agradecemos ao Dr. Olavo Feijó a lembrança das palavras de Paulo.
7 Gadamer (1997) é um dos autores que pensa as possíveis relações entre religião e esporte e entre religião e
política. Nisbet (1985), no epílogo à sua obra História da idéia de progresso, explorou a relação entre religião e
política enfatizando suas relações em termos do que têm em comum (líderes carismáticos, profetas, seguidores,
rituais, dias feriados, credo e evocação) e daquilo que as separa, resultando que o auge da política signifique o
declínio da religião. Assim, pode-se perguntar se a desilusão com a política não poderia significar um
ressurgimento da religião.
conversão para outra religião que, de alguma forma, restabelecesse a coerência entre a fé e suas
provas. Por último, poderia partir na direção de construir uma fórmula própria de práticas
espirituais. Um caminho de “ascensão interior” e uma procura do Deus interior, entendendo sua
presença como realização de valores almejados. O que ocorreu de fato, como veremos, foi essa
construção da fórmula própria, orientada pela vontade de concretizá-la, além das práticas
espirituais, no próprio campo do basquete.
Elementos da fórmula espiritual pessoal
Os estudos atuais sobre a religião põem a descoberto um amplo leque de crenças e
práticas religiosas, a partir de figuras santas ou carismáticas, que se transformam numa
multiplicação significativa de seitas religiosas. O carisma dos fundadores, segundo o conhecido tipo
ideal weberiano, será um capital racionalizado e burocratizado pelos sucessores na instituição
religiosa. Por assumir um caráter institucional, a vida religiosa nas seitas é bem mais visível que as
construções pessoais que realizam o bolo ou fórmula espiritual vivida como pessoal. As primeiras
são bem mais públicas, as outras ficam mais restritas à vida privada. Assim, a biografia e a
autobiografia ainda são relatos privilegiados para mapear e entender as construções pessoais.
Embora possa apresentar um conjunto de eventos, talvez desconexos ou aleatórios, como
vinculados por um fio condutor nem sempre visível a todo momento para o construtor do relato, a
autobiografia tende a destacar uma trama ou lógica para um conjunto rememorado de
acontecimentos que possibilitaram a construção pessoal.
Jackson, ao longo de seu livro, irá apontando experiências que foram significativas,
segundo seu auto-relato. A principal experiência negativa já foi mencionada, sua incapacidade de
“falar em línguas”. As experiências positivas, os elementos que passaram a fazer parte da
construção pessoal são vários e alinhavados, com algumas exceções, cronologicamente. Os
elementos destacados referem-se a propriedades ou funções que são reiteradas pelas teorias sobre
as religiões. Referem-se tanto a aspectos vinculantes ou de participação, presentes no mito e nas
religiões, quanto a etapas ou momentos altamente significativos do roteiro ou caminhada espiritual.
Um eixo ou fio construtor do relato de Jackson é a relação entre corpo e mente. Jackson
sofreu uma lesão corporal num jogo de beisebol e seu irmão Joe, doutorando em psicologia no
Texas, propôs auto-hipnose para recuperar o ritmo uma vez que a lesão cicatrizasse. A idéia
pareceu a Phil uma “blasfêmia, devido ao aprendizado religioso fundamentalista” (p. 37).
Entretanto concordou e, “no dia seguinte, arremessei melhor do que nunca. Esta foi minha
introdução ao poder oculto da mente, e ao que podia conseguir se diminuísse o diálogo mental e
simplesmente confiasse na sabedoria inata do corpo” (p. 38).8 O saber inato do corpo é um
componente altamente valorizado na literatura que se autodenomina natural, holística ou espiritual e
que se contrapõe à visão cartesiana ou reducionista que, segundo o ponto de vista alternativo,
estaria estruturando as ditas ciências oficiais.
Observemos que estamos diante de uma experiência em princípio contraditória, pois o
poder oculto da mente ou razão manifesta-se na diminuição do diálogo mental, que leva a confiar
na sabedoria inata ou poder do corpo para a ação ou expressão não controlada pela mente. O
significado da experiência reside na força que se deriva de sua própria contradição e em sua
confirmação pelo desempenho. Qual é o diálogo mental que atrapalha? Esta é a questão
significativa cuja resposta apenas pode ser prática e pessoal.
Páginas adiante, Jackson retoma a experiência e nos dá sua própria resposta. Vencer para
ele era uma questão de vida ou morte. A obsessão de vencer atrapalhou-o muitas vezes. “Eu fazia
tanta força para que as coisas saíssem como eu queria, que acabava prejudicando o resultado. Foi
8 Há uma poderosa corrente do pensamento nas práticas terapêuticas e nas atividades corporais que valoriza o
saber do corpo, supostamente reprimido pela racionalização cartesiana, pelo privilégio concedido à consciência
ou razão. Cf. Lacerda (1995).
essa a lição que aprendi depois de minha sessão de auto-hipnose com Joe” (p. 43). Jackson
descobre que pode funcionar “soltando tudo e não pensando” (p. 43), e essa sensação de
liberdade o acompanhará a vida toda. Como técnico de basquetebol, pretenderá que a sensação
de liberdade, emocionante em si mesma, seja um dos estados espirituais presentes na equipe
quando esta joga. A emoção da liberdade deve vincular a equipe.
A experiência positiva, um alicerce, será seguida na narrativa por um conjunto de
experiências desestruturantes ou que provocam uma certa situação de liminaridade em relação a
suas convicções religiosas familiares. Joe apresentará o zen budismo a Jackson, sob o ponto de
vista das técnicas de limpar a mente e prestar atenção ao presente. O conceito, para alguém criado
numa família pentecostal, foi, segundo Jackson declara, revolucionário e assustador. Mais tarde, já
na universidade, e realizando uma formação combinada em psicologia, filosofia e religião, o técnico
colocou Jackson junto ao astro do time, Pederson. Criado em ambiente luterano e possuidor de um
“saudável cinismo”, Pederson encorajará Jackson a olhar crítica e desapegadamente para os
valores que o alimentaram desde a infância, a explorar a vida com mais liberdade. As experiências
desestruturantes fazem com que Jackson abandone a alternativa da mera reprodução da tradição
religiosa familiar. Criam, por assim dizer, a necessidade de exploração de uma alternativa própria
que o levará na direção da construção da fórmula espiritualista ou religiosa pessoal. Trata-se,
portanto, de irmos reconhecendo o cenário dos atores e os elementos dessa construção da
espiritualidade interior.
Os anos 60 corriam soltos e Jackson atualiza-se na vida mundana dos campi universitários.
Rock, filmes de Fellini, namoro com a primeira mulher. O que nos interessa é aquilo que Jackson
declara que fica com ele dessas experiências: “O (…) que levei comigo quando essa década
acabou, foi a ênfase na compaixão e irmandade, estar junto e amar uns aos outros, aqui e agora,
parafraseando a Youngbloods. Já não me sentia tão isolado de minha geração. Pela primeira vez
em minha vida, não me sentia estranho entre as pessoas” (p. 44). Participação, fazer parte,
12
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vinculação são sentimentos atribuídos ao campo religioso e mítico. As idéias de comunidade e
fraternidade, compaixão e irmandade, estão aí presentes. Assim, qualquer que fosse a forma que a
fórmula pessoal de Jackson chegasse a ter, elas deveriam ser constitutivas da mesma.
Jackson decola no basquete e vai para New York, e inicia seu curso com o técnico Red
Holzman. Aprende a visão não egoísta de trabalho em equipe. Enunciemos as máximas de
Holzman: Não deixe que a raiva anuvie sua mente; a atenção é tudo e o poder de Nós é maior
que o poder do Eu. As duas primeiras máximas estão altamente correlacionadas com as técnicas
de concentração e de autocontrole. O sentimento negativo da raiva é controlado, como também o
fluir dos acontecimentos na consciência, que desvia o guerreiro ou o religioso da concentração
necessária no instante, no presente, da ação ou da meditação. Ambas contribuem com a
“impecabilidade”, termo cuja filiação religiosa é mais que evidente.9
Essa impecabilidade toma forma para Jackson no treinar relaxado e alerta. Nova
contradição, pois, de praxe, associamos o estado de alerta à tensão ou estresse. De fato, a
associação entre tensão e alerta está presente nos estudos psicofisiológicos sobre o estresse,
realizados sobretudo com animais em laboratório, desde os trabalhos pioneiros de Seyle.10 Jackson
inicia seu percurso na direção do relaxado alerta mediante a prática da visualização, mediante a
antecipação imaginada. O domínio de si mesmo no desenvolvimento da técnica levou-o, nas suas
palavras, ao seu momento máximo como esportista (p. 50). As relações com o yoga e as técnicas
de concentração zen são evidentes, porém, pelo relato, apenas tomam um caráter instrumental, são
apropriadas em função de um objetivo reduzido: maximizar o desempenho do atleta. Trata-se de
um processo de autocontrole por meio do qual se supera a condição natural de tenso alerta pela
condição de relaxado alerta. Nova condição que é um produto da cultura cuja matriz religiosa
9 Talvez a idéia de impecabilidade tenha sido difundida pelas influentes obras de Castañeda, atribuída ao estado
espiritual e à ação de Don Juán. No seu livro, Jackson menciona a obra de Castañeda.
10 Cf. Talvez a fórmula relaxado e alerta possa ser traduzida como estresse bom, boa tensão, equilíbrio entre
tensão e relaxamento, entre outras expressões semelhantes.
não dá lugar a dúvidas. Contudo, ela não é suficiente para completar a fórmula religiosa de
Jackson.
De fato, Jackson admite que o autocontrole, a atenção relaxada alerta faz com que jogue
sua melhor temporada e contribui para que seu time ganhe o campeonato (temporada 71-72). A
grande emoção do triunfo, no entanto, ele logo sente que se esvai: “Em vez de estar repleto de
alegria, senti-me confuso e vazio” (p. 50).Ou: “O que me faltava era direção espiritual. O legado
religioso de minha infância, até então não assumido, deixara-me com um grande vazio interior e um
anseio de reconexão com os mistérios maiores da vida” (p. 53).
A caminhada continua. Novas experiências e elaborações na construção da fórmula
pessoal: conversas com amigos, análise das cenas familiares marcantes, leituras, influências dos
livros de Castañeda, aulas de yoga, livros sobre religiões orientais, palestras de Krishnamurti, Pir
Vilayat Khan, participação nos rituais da Fundação Lama de Novo México, entre outras coisas.
Também as leituras de outras tradições aumentam a vontade de contemplar melhor as próprias
raízes. Surge a compreensão, com William James, de que a “experiência mística não precisa ser
uma grande produção” (p. 55). Acontecem experiências de concentração e chegadas ao zen.
O que mais me atraía no zen era sua ênfase na clareza mental.. Sob o ponto de
vista budista, o que polui a mente é o nosso desejo de obrigar a vida a se conformar
com as nossas idéias pessoais de como as coisas deveriam ser, em oposição a como
elas de fato são. (…) nosso apego desesperado a eles (os pensamentos autoreferentes),
e nossa resistência ao que de fato está acontecendo, é que criam em nós
tanta angústia (p. 57).
A concentração é um excelente instrumento. Faltava a Jackson cruzar com o elemento
vinculante que cria o sentimento de participação, de totalidade. O zen também seria uma escola
nesse sentido, pois leva-o a descobrir a ênfase na compaixão. É nela, afirma Jackson, que o zen e
o cristianismo se cruzam. Entre os Lakota Sioux,11 Jackson assimilou que o grande guerreiro podia
ser também o sacerdote, devido às crença de que tudo era sagrado e na unidade da vida. Assim, o
eu não era para eles uma entidade separada do Universo. Assimilou, segundo ele, a visão Lakota
do trabalho em equipe. Tudo conduz à afirmação de que sem a compaixão seria impossível realizar
o aforismo “o poder do Nós é maior que o poder do Eu”. A fórmula pessoal fica delineada.
Atenção relaxada em suas relações com a concentração acrescida da compaixão. A grande tarefa
será fazer funcionar na quadra de basquete. A relatar esse processo dedica Jackson o resto de seu
livro. Entremos com ele na quadra de basquete para observar apenas algumas relações que
estabelece, sem pretender realizar uma avaliação da eficácia de suas concepções, embora o ato de
ter conduzido os Bulls a vencerem cinco campeonatos nos anos 90 possa, para alguns, ser prova
mais do que suficiente.12 Contudo, teremos em mente que não é suficiente afirmar princípios
espiritualistas para o basquete; faz-se necessário demonstrar de alguma forma que isso funciona.
Fórmula religiosa e basquete
É claro que existe um componente intelectual em jogar basquete. A estratégia é
importante. Mas depois que o trabalho mental foi feito, chega um momento em que é
preciso mergulhar na ação, e colocar o seu coração no jogo. Isto significa não apenas
ser corajoso, mas também ser compassivo consigo mesmo, com seu companheiros e
seus adversários. Esta idéia foi uma parte fundamental de minha filosofia como técnico.
11 Jackson organizou em 1973, juntamente com Bill Bradley, uma clínica de basquete para os Lakota. Embora já
tivesse amigos Lakotas, declara que trabalhando com as crianças ficou fascinado pela cultura Lakota. O objetivo
da clínica foi dar aos Lakotas algo em que pensar que não fosse política (p. 115).
12 No momento em que escrevemos este artigo os Chicago Bulls estão diante da possibilidade de ganhar o sexto
campeonato sob a codução de Phil Jackson.
Mais que qualquer outra coisa, o que permitiu que os Bulls mantivessem um alto nível
de excelência foi a compaixão dos jogadores uns pelos outros (p. 61).
No dia que assumi os Bulls, fiz o voto de criar um meio ambiente baseado nos
princípios de não egoísmo e da compaixão, que eu havia apreendido como cristão na
casa de meus pais; sentado numa almofada praticando zen; e também estudando os
ensinamentos dos índios Lakotas Sioux (p. 17-18).
A maioria dos líderes tende a ver o trabalho de equipe como uma questão de
engenharia social (…), entretanto, aprendi que a forma mais eficaz de forjar um time
vencedor é conseguir que os jogadores façam contato com algo maior do que eles
mesmos. (…) o ato de criar uma equipe é essencialmente espiritual. Exige que os
indivíduos envolvidos abram mão de seu auto-interesse em prol do bem maior, para
que o todo possa ser mais que a soma das partes (p. 19).
Um sistema que enfatiza a cooperação e a liberdade (p. 18).
A ausência de egoísmo é a alma do trabalho de equipe (p. 19).
Em meu trabalho como técnico, descobri que era melhor lidar com os problemas
com uma perspectiva compassiva, tentando empatizar com o jogador e ver a situação
de seu ponto de vista, porque esta atitude tem um efeito transformador no time como
um todo (…) diminui a ansiedade do jogador (...) inspira outros jogadores a reagir da
mesma forma (p. 62).
A questão então é: como fazer essas coisas funcionarem?
O basquete americano tornou-se um esporte rápido e sincronizado. Jackson parte de um
diagnóstico técnico. O basquete praticado nos playgrounds dos centros urbanos, com extensão
nos anos 70 para a própria NBA, tinha um estilo que reforçava a perspectiva egoísta do jogo com
espetaculares jogadas de contra-ataque, levando a pensar que o basquete era uma sofisticada
competição por “enterrar” que envolvia apenas dois ou três jogadores.
Tex Winter foi um técnico diferente que tinha uma visão técnica também diferente do jogo:
achava que todos deviam participar num movimento de ataque contínuo. Embora fosse altamente
respeitado, existiam dúvidas por parte de outros técnicos sobre a adequação de suas idéias ao
basquete profissional, e ele próprio também as tinha. Jackson ouve Tex falar sobre seu sistema e
acredita ter encontrado o elo perdido que tinha procurado na CBA. Pensa que o sistema “é o
veículo perfeito para integrar mente e corpo, esporte e espírito, de uma forma prática, simples, que
qualquer um pode aprender” (p. 94). Significava uma evolução do ataque que os Knicks usavam
quando dirigidos por Red Holzman.13 “O triângulo ofensivo talvez seja melhor descrito como um
tai-chi-chuan para cinco homens” (p. 94). Assim, Jackson traduz para a linguagem zen, ou talvez
de fato crie, a estratégia a ser desenvolvida por meio dessa linguagem.14 A idéia básica é que na
orquestração do movimento a defesa acabe confundindo-se com o ataque. A questão não é
confrontar idéias, porém brincar com os defensores até fazê-los abrir a guarda.15 A descrição da
vida intelectual torna-se metáfora para o movimento físico dos corpos na quadra.
O sistema não pode funcionar, para Jackson, se os jogadores não superam o egoísmo. O
problema é então como ensinar-lhes a ausência de egoísmo, agindo contra os fatores da
idolatração e da mídia (p. 96). A resposta empírica, que se parece com a prática zen, é repetir as
práticas para treinar o jogador tanto em termos de experiência como intelectuais. No fim, alcançar
13 O leitor pode revisar as explicações sobre os três axiomas de Holzman enunciados acima.
14 No filme Full Monty (Tudo ou nada, na tradução brasileira) quando o experto em dança tenta explicar uma
coreografia, os dançarinos improvisados não conseguem realizá-la. Um deles diz que é o mesmo que fazer linha
de impedimento movimentando os braços. As dificuldades acabam imediatamente. Teríamos uma tradução ou de
fato uma criação de uma figura de dança a partir da tradição viva na linguagem do futebol?
15 Nas páginas 95 e 96 Jackson enuncia e comenta as sete regras básicas do sistema de Ted. Observe-se que o
princípio de brincar com os defensores até fazê-los abrir a guarda pareceria assemelhar-se à estratégia
pragmatista, descontrutivista e pós-moderna de Rorty. Cf. especialmente a reflexão de Bernstein (1991) sobre a
estratégia rortyana.
um estado de pleno gozo por participar da dança mesmo que apenas por um lindo momento de
transcendência (p. 98). Há que alcançar com o time um nível de desapego (p. 99). Jogar uns com
outros deve tornar-se o grande prazer. Assim, a vinculação, o pertencimento, devem estar na
mente e no corpo dos atletas em aliança como a autocompaixão e a compaixão.
Jackson utilizará todos os meios para alcançar seus objetivos: respeito pelo atleta, técnicas
de meditação, concentração e visualização, exercícios, sentimentos de intimidade com as coisas,
sala do time decorada com motivos rituais dos Lakota Sioux, palestras, leituras e filmes, postura de
liderança compassiva, entre outros. Torna-se um predicador que utiliza os recursos modernos para
educar de acordo com os valores de sua fórmula espiritual pessoal, aplicando-os ao basquetebol, e
resume sua atitude diante do fato afirmando: “Naquela época (quando jovem), eu teria rido de
qualquer pessoa que sugerisse que compaixão e ausência de egoísmo fossem o segredo do
sucesso. Estas eram qualidades que contavam na igreja, não na luta pelo rebote (p. 33).
O relato de Jackson serve para ilustrar o processo de transformação que vem sofrendo a
visão de religiosidade na pós-modernidade. Essa visão poderia, talvez, ser vista como mais
compatível com as marcas da teodicéia dita “oriental” — que valoriza o imanente em detrimento
do transcendente, permitindo que o cotidiano, inclusive o desportivo, seja atravessado pela idéia e
pela presença do divino. É possível também explorar a idéia de que as marcas “orientais” são, em
verdade, parte das próprias alternativas da tradição religiosa ocidental. Contudo, importa destacar
que o esforço de conciliar ou harmonizar eficiência técnica com espiritualismo é, de forma mais que
evidente, o tensor que atravessa os esforços de Jackson.

Referências bibliográficas

BERNSTEIN, R. 1991. Perfiles filosóficos. México, Siglo XXI.
BLOOM, H. 1994. La religión en los Estados Unidos. México, FCE.
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GADAMER, H-G. 1997. Mito y razón. Barcelona, Paidós.
GEORGE, N. 1992. Elevating the game. Nova York, Harper Collins Publishers.
HERVIEU-LÉGER, D. 1997. "Representam os surtos emocionais contemporâneos o fim da
secularização ou o fim da religião?", Religião e sociedade, Rio de Janeiro, vol. 18, n. 1, p. 31-47.
JACKSON, PH. e DELEHANTY, H. 1997. Cestas sagradas — lições espirituais de um
guerreiro das quadras. Rio de Janeiro, Rocco.
LACERDA, Y. 1995. Atividades corporais: o alternativo e o suave na educação física. Rio de
Janeiro, Sprint.
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________. 1997. Estética, esporte e educação física. Rio de Janeiro, Sprint.
NISBET, R. 1985. História da idéia de progresso. Brasília, UnB.
PARLEBAS, P. 1988. Elementos de sociologia del deporte. Málaga, Junta de Andaluzia e
Universidad Internacional Deportiva de Andaluzia.






Os valores do jogo

Um ex-jogador de basquete americano leva as regras das quadras para a vida
Por Eduardo Bom Angelo

"Campeonatos não são ganhos sem um time com forte sentimento de 
unidade, o que só é possível com o desprendimento de cada jogador"


The Values of the Game (ainda sem tradução para o português) é o quarto livro de Bill Bradley, 56 anos, ex-senador e candidato democrata à sucessão de Bill Clinton em 2000. Não são as qualificações políticas de Bradley que me chamaram a atenção para seu livro numa imensa livraria de Nova York. Bradley foi o capitão da equipe de basquete dos Estados Unidos na conquista da medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 1964. Também foi campeão da NBA em 1970 e 1973 pelo New York Knicks. O livro, lançado em setembro de 1998, relata a passagem de 11 anos do autor pela NBA e a influência desse período em sua vida até hoje. O esporte coletivo, como Bradley tão bem consegue mostrar, é rico em lições para todos os tipos de profissões.
Bill Bradley compartilha sua experiência com uma narrativa emocionante, e ilustrada com fotos dos craques da NBA e da WNBA, a versão feminina da Liga. O mais interessante do livro, entretanto, são os valores que Bradley traz das quadras para a vida. The Values of the Game tem uma regra de ouro que vale para todos nós: faça o que gosta, e faça-o com foco e energia. Se não estiver se divertindo, deve estar fazendo errado. Repense ou mude.
Bradley divide o livro em dez capítulos, cada um referente a um valor. São eles:
1. Paixão - Envolver-se, colocar emoção no que faz é o primeiro passo para ser bem-sucedido.
2. Disciplina - Treinar, treinar, treinar. Na vida profissional o verbo é estudar, estudar, estudar.
3. Desprendimento - No basquete quem faz o passe é tão importante quanto quem faz a cesta. A equipe equilibrada é aquela que tem bons arremessadores e bons armadores. Gente que pensa com gente que faz.
4. Respeito - Aja de acordo com as regras do jogo, atue com ética, não menospreze o adversário.
5. Perspectiva - Por ser um jogo que pode ser decidido nos segundos finais, o basquete mostra quão tênue é a linha entre a vitória e a derrota. Desenvolver essa percepção é um bom caminho para o auto-conhecimento.
6. Coragem - No basquete as decisões são tomadas rapidamente. A bola quase perdida pode transformar-se em pontos. Nunca desista.
7. Responsabilidade - Seu trabalho é muito importante para o desempenho da equipe. Concentre-se para fazer bem feito na primeira vez. O dever do técnico, por sua vez, é definir claramente o que espera de cada jogador. O paralelo com o ambiente empresarial é perfeito.
8. Resistência - A vida é bela, mas é dura também. Saber lidar com a adversidade é desenvolver a capacidade de aprender com os erros e com as derrotas.
9. Imaginação - Inovação e criatividade são irmãs gêmeas no basquete. Trazer esse espírito para a empresa é ser capaz de reinventar, sonhar, olhar para o futuro.
10. Liderança - Significa levar as pessoas a pensar, acreditar, ver e fazer o que possivelmente não fariam sem você. Significa jamais conjugar "eu ganhei, nós empatamos, eles perderam".





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